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sexta-feira, março 27, 2009

Carreirinho

Morte do Carreirinho, entre derradeiros caipiras

Aloisio Milani

Dos patriarcas da música caipira, hoje restam alguns poucos. A contar nos dedos. Sinal de um tempo passado em que a viola transpirava o Brasil antigo, guardado nos rincões das fazendas e que desembarcavam com sucesso estrondoso nas ondas das rádios da capital. Esse país da cultura popular está de luto nesta sexta-feira, 27, com a morte de um de seus principais compositores caipiras: Carreirinho, autor de clássicos como "Boi soberano" e "Ferreirinha".

Aos 87 anos, Adalto Ezequiel faleceu num hospital paulistano, vítima de complicações após um derrame que o deixou inconsciente e respirando com a ajuda de aparelhos há mais de uma semana. O velório e o enterro serão realizados hoje no Cemitério Jaraguá, no Km 23 da rodovia Anhanguera, em São Paulo. Carreirinho deixa dona Mariana como viúva.

Carreirinho nasceu em 1921 na pequena Bofete, interior de São Paulo, a mesma cidade descrita e estudada no clássico da sociologia Parceiros do Rio Bonito, de Antonio Candido, para relatar a cultura caipira. Bofete hoje tem até praça com monumento de Carrerinho. Inezita Barroso, a apresentadora do "Viola, minha viola", da TV Cultura, lembra que esse era um orgulho dele.

- Carrerinho tinha um carinho grande pelas pessoas que lembravam dele por sua história muito digna e bela. Uma vez, numa homenagem, fizemos uma foto de frente ao monumento dele na cidade. Fotografia que guardo com o coração - diz Inezita Barroso

Entre suas principais músicas, está "Ferreirinha" - a crônica de um peão que procurava seu amigo desaparecido depois de sair para tocar uma boiada. O encontrou morto e fez um malabarismo para levá-lo para um enterro decente.

Pra levar meu companheiro veja quanto eu padeci
Amarrei ele pro peito numa árvore suspendi
Cheguei meu cavalo em baixo e na garupa desci
E com cabo dum cabresto amarrei ele ni mim

Outro marco de sua carreira foi a moda "Canoeiro", um causo de pescaria de final de semana. A toada ficou marcada na memória de quase todos que têm mais de 40 anos de vida e apreciam a música raiz.

Domingo de tardezinha, eu estava mesmo a toa
convidei meu companheiro, pra ir pescar na lagoa
Levemos a rede e o lanço
Ai, ai fomos pescar de canoa

Nos últimos anos, estava mais afastado de apresentações por dificuldades de saúde. Mesmo assim compareceu a algumas homenagens, na maior parte das vezes acompanhado por seu ex-parceiro de viola Carreiro e a família de catireiros de Oliveira Alves Fontes, em Guarulhos.

A pedido de Terra Magazine, diversos músicos, personalidades e intelectuais deram seus depoimentos sobre a morte de Carreirinho. Justa homenagem, ainda que póstuma. Seguem...

Inezita Barroso: "Carreirinho foi um grande compositor e, principalmente, muito humilde. Sua simplicidade e sua timidez, inclusive, não o deixararam ser tão conhecido. Mas ele escreveu clássicos maravilhosos da música caipira. Não a velha música, a séria. Faz parte do tronco de nossa história brasileira".

José Hamilton Ribeiro: "Várias das músicas de Carreirinho podem ser colocadas em primeiro lugar em qualquer lista das melhores. Depende do gosto, claro. Mas várias têm potencial de estar lá. As letras dele são verdadeiras lições de português, porque é impossível contar aquelas histórias de outro modo. 'Ferreirinha', por exemplo, não tem o que tirar nem colocar. É uma lição de compositor, até uma lição jornalística. Está entre os gênios caipiras".

Roberto Correa: "Carreirinho foi um dos melhores compositores de todos os tempos. Deixou clássicos impressionantes. Ao lado de Zé Carreiro, constituiu uma das melhores duplas caipiras da história."

Daniel: "Uma pena que a música sertaneja tenha perdido um ícone, uma referência, como o Carreirinho. Tinha uma grande admiração pelo trabalho dele, assim como meu pai também. Só podemos agora orar por ele e para que sua família tenha conforto e paz".

Terra Magazine