"Não! Eu sou o Rei do Baião! O Rei da Sanfona é Mario Zan."
Luiz Gonzaga (1912 - 1989).
Acordeonista e Compositor, Italiano de nascimento, Mario João Zandomenighi nasceu em Roncade, Vêneto no dia 09/10/1920 e faleceu na Capital Paulista no dia 08/11/2006.
Com apenas 4 anos de idade, Mário veio para o Brasil juntamente com seus pais, José Zandomenighi e Ema Carmelo que, cansados que estavam de tantas guerras, queriam na verdade uma vida melhor e mais digna para seus filhos. A família escolheu o Brasil e se estabeleceu em Santa Adélia-SP, próximo a Catanduva-SP.
E, nas freqüentes festas interioranas ao longo do ano, o pequeno Mário não tirava o olho dos sanfoneiros e ficava atento às Rancheiras, Polcas, Arrasta-pés, Valsas e outros ritmos tradicionais no Interior Paulista. E, com apenas 6 anos, conseguiu que seu pai lhe presenteasse com uma pequena sanfona, a qual aprendeu a tocar sem professor e durante várias horas por dia.
Com apenas 10 anos de idade, o "Moleque da Sanfona", como ficou conhecido, animou um baile de casamento. E isso se deu no tempo, em que o sanfoneiro cantava sobre uma mesa para poder espalhar melhor o som (já que não existiam amplificadores na época).
Algum tempo depois, seus pais se mudaram para São Paulo-SP, onde Mário acabou encontrando um "outro mundo de possibilidades", entre as quais o Rádio e também a carreira de Solista.
Na mesma época, o mercado fonográfico começava a se dar conta de que as Festas Juninas também eram lucrativas, mesmo comparadas às altas vendas que alcançavam no período que se estendia de Dezembro até o Carnaval. Tal fenomeno musical fez com que o jovem Acordeonista apostasse na Música de Festa Junina como parte principal de seu repertório.
Apenas para citar alguns exemplos, compositores como Lamartine Babo ("Chegou a Hora da Fogueira" e "Isto é Lá com Santo Antônio") e Ary Barroso ("Sobe Meu Balão"), além de consagrados intérpretes como Francisco Alves e Carmen Miranda, emplacaram vários sucessos e a maior parte dessas marchinhas fazia parte dos shows de Mario Zan.
Em São Paulo, aos 14 anos, Mário Zan estudou Acordeon com Ângelo Reale e Teoria Musical com o Maestro Tripicchioni. Isso sem deixar de animar os bailes e matinês na periferia da Capital e cidades adjacentes; chegava a fazer até quatro apresentações por dia.
De bastante versatilidade, Mario Zan tocava até mesmo Tangos e Chorinhos. Apresentou-se pela primeira vez no Rádio (a Educadora Paulista, atual Gazeta), no programa de calouros "Peneira Roldini" e ganhou o primeiro lugar interpretando o célebre Chorinho "Tico-Tico no Fubá" (Zequinha de Abreu), acompanhado do Regional de Zé da Pinta.
Foi então que Armando Bertoni, Diretor Artístico da Rádio Tupi, tendo ouvido e gostado da performance do jovem acordeonista, deu ao menino meia hora para se apresentar na famosa Emissora Associada. O primeiro emprego, por outro lado, Mário Zan só conseguiu na Rádio Bandeirantes, que acabara de ser inaugurada.
E foi na Bandeirantes que Mário João Zandomenighi adotou o nome artístico de Mário Zan, sugerido por Walter Foster que, achando que seria "um nome forte", considerava também a "dificuldade para o público decorar o nome Zandomenighi"... E foi também na Bandeirantes que Mário Zan ficou conhecido como "O sanfoneiro que brinca com a sanfona". A belíssima foto de Mário Zan à esquerda é do Acervo do site Nosso Encontro com Ubiratan Lustosa, célebre radialista que faz parte da História do Rádio no Estado do Paraná.
E após um breve período na Rádio Nacional (atual Globo) de São Paulo-SP (onde Mário Zan acompanhou inclusive a dupla " Palmeira e Piraci"), o jovem acordeonista juntou alguns trocados e foi se aventurar no Rio de Janeiro-RJ.
Na Cidade Maravilhosa, após algumas dificuldades que enfrentou, Mário Zan conheceu outro excelente Sanfoneiro, o pernambucano Luiz Gonzaga, que não lhe poupou elogios quando ouviu seu Acordeon. E foi com a ajuda do Rei do Baião que Mário Zan iniciou uma brilhante carreira na então Capital Federal, tendo tocado no "Samba Dance", e também no Cassino Atlântico em Copacabana.
Seguiram-se então apresentações no "Quitandinha" em Petrópolis-RJ, e também nas estâncias hidrominerais de São Lourenço-MG, Caxambu-MG, Lambari-MG e Cambuquira-MG.
E, com o fim dos cassinos, decretado pelo então presidente Eurico Gaspar Dutra, Mário Zan voltou para a Paulicéia Desvairada, de onde partiu para algumas apresentações em cinemas do Interior juntamente com Nhô Pai, Nhá Fia e o Capitão Furtado.
E, nessas apresentações nos cinemas da Empresa Pedutti, Mário Zan percorreu o Triângulo Mineiro, e também o Interior dos Estados de Goiás e Mato Grosso (que na época "ainda era um só"), onde atravessou rios e pastos em carros de boi e pequenos caminhões de mudança e compôs algumas célebres páginas inspiradas na Região como "Chalana" (Mário Zan - Arlindo Pinto) e "Ciriema" (Mário Zan - Nhô Pai).
"Chalana", por sinal, uma de suas primeiras composições, inicialmente instrumental, "...surgiu do sofrimento durante a excursão, da saudade que sentia, sem notícias da família..." A inspiração aconteceu na cidade de Corumbá-MS, da janela do Hotel São Bento, às margens do Rio Paraguai, onde Mário Zan se hospedou na época. Mário Zan compôs "Chalana" vendo as águas do rio e os pequenos barquinhos típicos passando... O célebre Acordeonista também já voltou por lá para "matar saudades"... "... o hotel está velhinho... coitado..."
Por essa época tiveram início suas primeiras gravações na Continental e na RCA. Continuou viajando, tornando-se cada vez mais conhecido como excelente solista de Acordeon por todo o Brasil. Mário Zan garante também que foi o primeiro artista a se apresentar no Território de Roraima. E nas viagens, vendia, sorteava e presenteava seus discos nos diversos shows que fazia.
Em 1954, a Cidade de São Paulo comemorou seus 400 anos de fundação e foi nesse ano que Mário Zan gravou seu famoso dobrado "Quarto Centenário" (Mário Zan - J. M. Alves) que se tornou Hino da Capital Paulista. E a vendagem de um milhão de cópias em poucos meses foi sem dúvida um marco na discografia nacional.
Mário Zan também se dedicou à pesquisa de ritmos e lançou em 1956 juntamente com Nonô Basílio a "Tupiana", que é "uma espécie de Guarânia, com influência da música dos índios Tupi-Guaranis, em compasso 3 x 4, com batidas ritmadas marcadas pelo tambor", de acordo com a jornalista e pesquisadora Rosa Nepomuceno em seu excelente livro Música Caipira - Da Roça Ao Rodeio.
Face à "invasão" dos rítmos paraguaios em nossa Música, principalmente na Região do Mato Grosso do Sul, Mário Zan e Nonô Basílio resolveram criar o novo ritmo de resistência dentro da Música Brasileira.
Curiosamente o próprio Mário Zan havia sido antes um dos principais expoentes da introdução de tais elementos vindos "de fora" em nossa Música Brasileira, como por exemplo, a célebre "Chalana" (Mário Zan - Arlindo Pinto) que é uma Guarânia e foi composta às margens do Rio Paraguai, na cidade de Corumbá-MS.
A primeira Tupiana foi "Alvorada Tupi" gravada na RCA Victor pelo Duo Irmãs Celeste. O Duo Irmãs Celeste e também os próprios autores chegaram a gravar outras "Tupianas". Tal ritmo, no entanto, não atingiu o grande público e não foi grande sucesso de vendas. De acordo com Mário Zan, a Tupiana "... não pegou, não teve divulgação. Naquele tempo não existia mídia, hoje qualquer bobagam que você fala tem repercussão."
Mário Zan também participou dos filmes "Tristeza do Jeca" (de Mílton Amaral), "Casinha Pequenina" (de Glauco Mirko Laurelli) e "Da Terra Nasce o Ódio" (de Antoninho Hossri).
Em 1958, iniciou-se o enorme sucesso do famosíssimo Rasqueado "Nova Flor" (Palmeira - Mário Zan), conhecido também como "Os Homens Não Devem Chorar", que conheceu versões em Castelhano ("Los Hombres No Deben Llorar" - versão de Pepe Ávila) e em Inglês ("Love Me Like A Stranger" versão de Arthur Hamilton), tendo tido inúmeras regravações no mundo inteiro, além do Brasil.
Calcula-se que Mário Zan tenha tido aproximadamente 1.000 músicas gravadas em mais de 300 discos 78 RPM e mais de 60 LPs; e cerca de 36 músicas suas também foram gravadas por diversos cantores de outros países.
Esse maravilhoso Músico octogenário era uma pessoa bastante simpática e bem-humorada. E, como "O Sol nasce para todos" Mário Zan também tinha um ótimo relacionamento com colegas Sanfoneiros ilustres tais como Dominguinhos e Sivuca, a exemplo da amizade que também mantinha com o saudoso Rei do Baião Luiz Gonzaga, num espírito de amizade e camaradagem.
Sua popularidade como "o maior solista de festas juninas de todos os tempos" foi inclusive reverenciada pelo saudoso Luiz Gonzaga. Além de suas diversas composições do gênero, Mário Zan também lançou em disco uma série de marcações para Quadrilhas.
Antes de começar a tocar, conversava com os ouvintes que participavam da famosa dança de origem francesa (e que também foi musicada por Villa-Lobos). Os pares se organizavam por sexo e lugar e o Sanfoneiro passava a tocar, coordenando ao mesmo tempo a apresentação.
Um de seus maiores sucessos no gênero é sem dúvida "Festa na Roça" (Palmeira - Mário Zan). Enfim, onde tem São João, a música e a Sanfona de Mario Zan estão presentes de uma forma ou de outra.
Mesmo assim, o excelente solista dispensava o título de "Rei da Quadrilha", achando que "... não pega bem, parece coisa de mafioso..."
Também, segundo Mário Zan, a Música solada ou instrumental, "sem letra", permite ao ouvinte "fazer outras coisas enquanto a ouve". Já a Música cantada, com letra, exige atenção. Ainda sobre a Música cantada, Mário Zan nos falava sobre as "letras com duplo sentido", muito comuns nos Forrós mais recentes: "Gonzagão foi o Rei de tudo isso cantando Músicas bonitas, sem apelação de sexo (...) Baião tem de ser alegre, não ofensivo (...) Acho que todos deveriam seguir a escola de Gonzaga e usar a Música para falar das histórias, dos romances e da Cultura do Nordeste."
Famoso também fora do Brasil, Mário Zan possui seu nome e foto expostos no Museu de Artes de Frankfurt, na Alemanha, ao lado de grandes instrumentistas de todos os tempos, considerado no referido museu como o "acordeonista mais sentimental de todos os tempos".
E, na Capital Mexicana, já recebeu diversas homenagens devido ao sucesso de suas músicas naquele país. ("Los Hombres No Deben Llorar" que o diga...).
Mário Zan também foi empresário do Duo Irmãs Celeste, a famosa dupla formada por Diva Araújo e Geisa Araújo, ambas de Sacramento-MG. O Acordeonista também foi o esposo de Geisa que passou a seguir carreira solo, tendo se apresentado inclusive na Alemanha. Mais tarde, porém, o casal se separou e Geísa acabou abandonando a carreira artística. Diva, por outro lado, permaneceu na carreira tendo sido contratada pela Rádio São Paulo, onde se apresentou como cantora e atriz de rádio. Ver à direita a capa da Revista Sertaneja - Ano II - Nº 13 – Abril/1959 com Mário Zan e o Duo Irmãs Celeste.
Mário Zan "passou para o Andar de Cima" às 20:00 do dia 08/11/2006, no Hospital Central Sorocabana em São Paulo-SP, vítima de insuficiência respiratória, menos de um mês após ter completado 86 anos de vida.
O corpo de Mário Zan foi velado na Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo e sepultado no dia 09/11/2006 às 15h30 no Cemitério da Consolação na Capital Paulista, ao lado do jazigo da Marquesa de Santos, conforme seu desejo.
Poucos anos antes de falecer, "longe dos holofotes", Mario Zan continuava a animar centenas (se não milhares... ) de festas juninas, com inúmeros CDs que ainda vendia e, com energia jovial, sentia-se recompensado e feliz quando tocava para fazer o povo dançar. "Toco o que o povo quer", repetia ele com entusiasmo! E, na foto à esquerda, Mário Zan no topo do edifício onde residia, no Centro da Paulicéia Desvairada.
Clique aqui e conheça um excelente artigo dedicado ao "Mario Zan, o Soberano da Canção Popular na Sanfona" do dia 21/06/2002, riquíssimo em informações!
Algumas composições de Mário Zan:
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